domingo, 19 de fevereiro de 2012

Literatura e vida

                    Há de se mergulhar neste maravilhoso, colorido e surpreendente mundo da literatura com olhos de quem busca a vida, suas manifestações e constantes mudanças. Pois, mais que expressão de ideias, é a literatura o fascinante retrato da vida (nem sempre com finais felizes), mas ainda assim VIDA em diferentes focos e cores.

O SER HUMANO

Barroco - Atormentado pela certeza da brevidade da vida e os temores da morte, o homem vive dividido entre o desejo de viver os prazeres que a vida lhe pode oferecer e as promessas de vida eterna de uma religião castradora. Debate-se constantemente entre mundos opostos e incertezas, busca o perdão divino mostrando-se como pecador arrependido

Pequei, Senhor, mas não porque hei  pecado,
Da vossa piedade me despido,
Porque quanto mais tenho delinqüido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.

Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido,
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.

Se uma ovelha perdida, e já cobrada
Glória tal, e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na sacra história:

Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada
Cobrai-a, e não queirais, Pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
              Gregório de Matos

Arcadismo - Acredita no poder da razão, única força capaz de mudar o mundo e orientar o homem. As luzes do conhecimento, assim, guiam suas ações. 


O ser herói, Marília, não consiste
Em queimar os impérios: move a guerra,
Espalha o sangue humano,
E despovoa a terra
Também o mau tirano.
Consiste o ser herói em viver justo:
E tanto pode ser herói o pobre,
Como o maior Augusto.
                      Tomás Antônio Gonzaga 

Romantismo - Deixa-se dominar pelas paixões e nada é mais importante que seus sentimentos, que de tão intensos podem levá-lo à morte.


"Lerás porém algum dia
Meus versos, d’alma arrancados,
D'amargo pranto banhados,
Com sangue escritos;- e então
confio que te comovas,
Que a minha dor te apiade,
Que chores, não de saudade,
Nem de amor,- de compaixão."
(Gonçalves Dias)

Realismo - É um ser repleto de qualidades e defeitos. Não é herói nem vilão. É apenas humano, "Demasiado humano".

"Não digo que já lhe coubesse a primazia da beleza entre as mocinhas do tempo, porque isto não é romance em que o autor sobredoura a realidade e fecha os olhos às sardas e espinhas; mas também não digo que lhe maculasse o rosto nenhuma sarda ou espinha, não. Era bonita, fresca, saía das mãos da natureza cheia daquele feitiço precário e eterno, que o indivíduo passa a outro indivíduo para os fins secretos da criação. Era isso Virgília, e era clara, faceira, ignorante; pueril, cheia de uns ímpetos misteriosos; muita preguiça e alguma devoção - devoção, ou talvez medo; creio que medo."
                                    (Memórias Póstumas de Brás Cubas, Machado de Assis)


Naturalismo - Um bicho repleto de vícios e taras, tendo suas ações condicionadas por instintos. 

 
       “Têm mais pecados na consciência que um confessor no ouvido; uma mentira em cada dente, um vício em cada polegada de pele. Fiem-se neles... são servis, traidores, brutais, adulões. Fuja deles, fuja deles. Cheiram a corrupção, emprestam de longe. Corja de hipócritas! Imorais!”
                (Apresentação que Rebelo, aluno veterano, faz dos companheiros a Sérgio)

Simbolismo - Emocional, místico e descrente do mundo e da ciência, vê na morte a sublimação de sua alma e a libertação desta da prisão que é o corpo.


     

Cavador do infinito
Com a lâmpada do Sonho desce aflito
E sobe aos mundos mais impoderáveis,
Vai abafando as queixas implacáveis,
Da alma o profundo e soluçado grito.

Ânsias, Desejos, tudo a fogo escrito
Sente, em redor, nos astros inefáveis.
Cava nas fundas eras insondáveis
O cavador do trágico Infinito.

E quanto mais pelo Infinito cava
Mais o Infinito se transforma em lava
E o cavador se perde nas distâncias...

Alto levanta a lâmpada do Sonho
E com seu vulto pálido e tristonho
Cava os abismos das eternas ânsias!
                 Cruz e Sousa

Modernismo - É um sobrevivente. Tem a consciência de que a vida é o resultado de sua força e da determinação de continuar existindo.


Sozinho no escuro
Qual bicho-do-mato
Sem teogonia ,
Sem parede nua
Para se encostar,
Sem cavalo preto
Que fuja a galope,
Você marcha, José!
José, para onde?
        Carlos Drummond